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Processo de escrita e pesquisa Normose - Estética do Caos e Metalinguagem

  • Antologia Crítica
  • 23 de ago. de 2024
  • 22 min de leitura

E aí, tudo suave por aí? Quem diria que estaremos caminhando para o sexto ano de Canal Normose, e depois de tantas ameaças de morte, e também tantos lugares que eu nunca imaginei que eu ia conhecer, ou pessoas que eu ia encontrar, ou até virar amigo, eu queria te contar uma coisa, mas antes de contar essa coisa, eu preciso fazer um desabafo. Eu sou um caos. O caos em pessoa.


Às vezes eu sinto que minha cabeça é como um navegador de internet com 300 abas abertas. Quanto mais abas eu abro, mais abas eu quero abrir, e isso nunca termina. Você já sentiu isso? Sinto minha vida pulando de assunto, em assunto, de assunto, em assunto, como um macaquinho pulando de galho em galho.


Por isso não tenho vergonha de dizer. Invejo muito as pessoas organizadas. Aquelas que conseguem cumprir calendário, seguir um só assunto, mergulhar em um só estudo de cada vez, andar em linha reta.


São as pessoas que pisam na calçada preta e branca e não se incomodam com isso. Que inveja! Eu sou uma pessoa do tipo parentes. No implante do assunto, eu tenho muita dificuldade em entender por onde começar, e conforme eu vou falando e vai aparecendo coisas na minha cabeça, quais coisas eu preciso falar, quais coisas não.



E aí eu vou abrindo parênteses e mais parênteses, e nem sempre eu fecho esses parênteses. Eu sou do tipo que questiona, o chato, o que pergunta onde, porquê, quem, o quê. E eu quero saber onde foi feito, como começou, qual é a história.


E isso pra qualquer assunto. Qualquer assunto, às vezes eu me perco horas e mais horas lendo sobre aquilo. E como tudo na vida, isso tem ganhos e perdas, por um lado.


Uma mente caótica gosta do aleatório. Ligar nada com lugar algum. Misturar temas e ideias.


Viver uma não rotina, em lugares diversos, com pessoas diversas. O caos ajuda na criatividade. E colabora, por exemplo, pra que eu tenha muitos temas aqui no canal.


Nunca faltam ideias, assuntos ou vontade de pesquisar. Então, por exemplo, se eu quisesse fazer um vídeo pra falar da estética do Normose, dos algoritmos, e como isso dita o meu processo criativo, e a forma que eu escrevo os roteiros e faço os vídeos aqui dentro. Talvez eu desse toda uma volta, que começasse lá na minha infância, e todos os meus amigos, pra daí sim te contar o tema do vídeo.


Mas se o caos ganha algumas coisas na criatividade, ele é péssimo pra organização. Pra responder pessoas no tempo. Pra entregar as coisas no prazo devido, sem que eu me perca estudando o triplo que precisa.


Pra cumprir horários. Pra manter próximo de mim objetos, sem que eu perca 6 mil vezes o celular no mesmo dia, e aí eu acho que ele tá no meu bolso. Ser um caos seria péssimo pra ter um canal, e muito pior ainda pra vida social.


Então eu precisei amadurecer, conhecer esse caos, entender, e aí trabalhar a partir dele, com ele. Fazer esse caos que faz parte de mim, se tornar um caos organizado, um caos domesticado. No início do canal, eu tinha muita dificuldade pra escrever os roteiros, porque eu tava treinado no modo acadêmico.


Escrevia artigos, comentários afirmativos, coisas com pé e cabeça, e pude perceber, por exemplo, que quando eu sento pra escrever, eu preciso desse caos. É o caos criativo. E perceber que eu odeio a forma linear de escrita.


É isso mesmo, você ouviu. Claro, as histórias precisam ter começo, meio e fim, é óbvio. Mas simplesmente não é assim que nós pensamos ou vivemos. Ou pelo menos não é assim que eu me vejo pensando no dia a dia.


Quando um tema surge na minha cabeça, as ideias não surgem organizadas. Elas são livres, associadas por nós, que, acessando aquilo que nós já temos na nossa mente, vamos fazendo as novas conexões.


O nosso pensamento se estrutura de forma caótica, linhas que se cruzam. Uma constituição é linear, mas o jeito que o direito acontece é transversal. As regras de carro são lineares. O trânsito é transversal. Um verbete da Wikipedia é linear, mas ele é cheio de hiperlinks. Transversal.


A vida não é linear, a vida é multiplicidade. Por exemplo, cada palavra que eu disser pra você nesse texto é um múltiplo complexo infinito de significados, quer ver só?


Presta atenção nas palavras comunismo, capitalismo, ou casa da sua avó. Cada uma das pessoas que tá ouvindo esse vídeo vai pensar numa figura diferente, numa opinião diferente, num ponto de vista diverso sobre aquilo. E parando pra pensar por esse ponto de vista, é um milagre que a gente consiga se comunicar. Cada um tá falando uma coisa diferente sobre um fato. Nossa compreensão de mundo não é uniforme nem linear, e as coisas também não acontecem desse jeito. Apesar do nosso vício humano de tentar organizar e pôr ordem dentro do caos.


Agora, aqui na minha escrita e aqui no canal, eu não faço desse jeito não. Aqui no canal eu nunca escrevo o roteiro do tipo ah, era uma vez isso, e depois aquilo, e depois aquilo outro.


Roteiro


Então eu aprendi a escrever em módulos livres, em blocos de pensamento. Como quando pensamos, não há começo, meio e fim, o começo da minha escrita é sempre livre, porque penso que num texto linear há perda de sentido quando se estabelece uma ordem hierárquica dos argumentos. Ou desdobrando aquilo sem muita preocupação com pé e cabeça.


Eu vou só escrevendo, colocando as linhas transversalmente. Então cada parágrafo que você tá ouvindo aqui, é escrito de forma quase aleatória, e pode ser realocado de qualquer ponto pra qualquer ponto. Mas claro, em algum momento eu vou organizar o caos. Porque antes, antes de tudo mesmo, já que eu quero manter essa escrita mais livre e caótica, eu preciso responder uma pergunta objetiva.


Quanto tempo eu tenho pra esse vídeo ir ao ar? Quanto tempo eu tenho exatamente pra escrever? Isso parece trivial, mas muda tudo. Veja, se você entregar um quadro pra um pintor, ele pode tranquilamente encontrar defeitos e fazer sua própria obra pro resto da sua vida.


Porque claro, conforme ele aprende novas técnicas, ou tem novas experiências, ele muda seu olhar sobre aquele quadro, e pode ver e desejar novas coisas pra aquela obra. O mesmo vale pra um texto. Textos não têm fim. Nenhuma escrita termina. Todo texto tem apenas prazo de validade e entrega. E eu aprendi isso a duras penas, atrasando o conteúdo aqui dentro.


Então se eu não tiver um recorte do tempo, fica muito mais difícil de se organizar pra escrever. Então pra quem sempre pergunta aqui nos comentários quanto tempo eu demoro pra fazer os vídeos, a resposta é caos. Caos organizado.


Tem vídeos aqui no canal que demoram 3 meses pra ficar pronto. Tem vídeos que demoram 6 meses, 10 meses, como foi o documentário da Lava Jato. Assim eu fiquei 10 meses pra escrever e pesquisar pra um vídeo de YouTube.


Eu gosto, mas escrever 10 meses pro modelo de negócio que o YouTube propõe, não é exatamente a melhor estratégia, não é? Imagina se eu lançasse vídeo a cada 6 meses. Seria meu sonho? Seria. Mas em pouco tempo seria o fim certeiro do meu canal, que certamente acabaria enterrado pelo algoritmo da plataforma.


Então o que eu fiz? Eu me adaptei. Como eu tenho muita dificuldade de escrever um texto só de cada vez, eu escrevo 4, 5 ou 6 roteiros de modo que eu separe quanto tempo demora cada um pra eu poder escrever roteiros mais longos, de médio prazo, de curto prazo, pra eu estar sempre escrevendo e pulando entre os meus interesses caóticos sem que esse canal pare de uma vez. Então tem alguns vídeos que saem em uma semana, como esse vídeo do Império Romano.


Alguns em 3 meses, tipo o vídeo do Red Pill. Outros em 6 meses, como do Léo Lins e do Danilo Gentili. E tem aqueles que demoram mais de um ano, tipo o do Brasil Paralelo.


E esse foi o jeito que eu me adaptei pro meu jeito de escrever sem que eu seja comido e engolido pela máquina de moer gente do YouTube, mas consiga ainda assim trazer textos novos, coisas que eu consiga pesquisar, que é o que eu sempre gostei de fazer, mas que não é o que a plataforma privilegia e nunca privilegiará.


Ok, nunca é forte, mas veja, eu tenho toda a compreensão de que o YouTube não é uma plataforma de estudos. O YouTube não é uma plataforma de aulas. E por mais que tenha divulgação de conhecimento aqui dentro, esse não é o maior foco dessa plataforma.


Não para o business, não para os negócios que a plataforma quer vender. Aqui é uma plataforma de propaganda, como em qualquer outra mídia. Eu já falei isso em outros episódios aqui dentro, mas vou repetir.


Em toda mídia, apesar de parecer que a propaganda é uma distração do programa que você assiste, é o inverso. Tudo que você vê aqui dentro é um disfarce pra passar propaganda. E eu não tenho como fugir desse modelo sozinho, pelo menos por enquanto.


Por isso eu me adaptei a esse modelo. Pautas mais frias, me preparar muito tempo antes para escrever roteiros, até porque eu sei como funciona a política brasileira. Ao mesmo tempo, o mundo é caótico e eu sei que às vezes eu preciso parar tudo porque acontece alguma coisa como foi o PL das fake news e que qualquer coisa ali poderia mudar a opinião pública.


E essa coisa da máquina de propaganda é tão verdade que o próprio YouTube usou o seu site, na época da PL das fake news, para divulgar sua posição, mas não para explicar e divulgar o conhecimento. Claro, aqui é uma plataforma de reafirmar posições. Propaganda.


Por isso que ainda é necessário produzir cortes menores para outras redes, o que exige equipe, tal, tal, tal, mas esse é assunto pra outro dia. Resolvido a questão do tempo e sabendo exatamente quanto vou ter pra escrever o texto, vou pro próximo passo. Lembrar que eu tô escrevendo pra você dentro do YouTube e você tá no YouTube pra passar tempo.


Ainda que você estiver se informando, você tá aqui pra se entreter e eu preciso ter isso em mente. Você não tá aqui pra estudar, você não tá aqui pra uma aula, você não tá aqui pra rezar, pelo menos a grande maioria tá aqui pra nada além de divertir-se e passar um pouco do tempo livre e pra isso se dispõe a me ouvir. Mas tem muitas opções por aí e eu preciso chamar atenção de alguma maneira.


Por que alguém vai clicar no meu vídeo e não em todos os outros? Então vamos dizer que eu queira conversar sobre o problema da máquina-algoritmo do YouTube e como isso determina, de cima pra baixo, a estética das produções aqui dentro e em como nos comportamos dentro da plataforma.


Se fosse um artigo científico, bastaria eu pesquisar os dados, ler os artigos, encontrar as fontes primárias, uma dúzia de livros, ler as revisões, escrever, a partir das minhas pesquisas, certo? Mas imagina se eu lançasse um vídeo assim, despejando os dados e parâmetros acadêmicos. Ou se esse vídeo fosse sobre a lógica da produtividade, os fundamentos estéticos e epistemológicos na construção da narrativa do vídeo-ensaio brasileiro no site YouTube.


Ninguém ia clicar nesse episódio, na moral, papo reto mesmo, nem eu ia assistir essa parada. Ia ter 20 views. Então não posso desconsiderar que o meio é a mensagem.



É o clichê mesmo, mas é preciso adaptar a mensagem pro lugar que você tá, pro seu ouvinte, pra sua plataforma, pra tecnologia que ela disponibiliza. E é nessa lógica que aqui dentro imperam os clickbaits. Por exemplo, nos primeiros anos de canal, eu me preservei muito em relação a isso.


Eu me segurava por algumas opiniões meio teimosas, mas eu não sou cabeça dura. Foi depois que eu assisti um vídeo do Veritasium, um canal muito respeitado no YouTube lá fora, que eu saí plenamente convencido de que não tinha pra onde eu fugir. Eu saí plenamente convencido de que não tinha como não ter uma embalagem brilhante que chamasse a atenção no mar da economia da atenção.



E aí eu aderi o clickbait mesmo. Desculpa, clickbait dá muito resultado. Eu demorei pra me render, mas hoje eu entendi.


Eu não sou produtor de vídeos, eu sou produtor de títulos. Títulos é o mais importante de tudo aqui dentro do YouTube. Aqui dentro ninguém tem obrigação de me ver e eu escolhi estar nessa vitrine.



Assim como o pavão tem plumas bonitas pra fazer a dança do acasalamento, as marcas capricham na embalagem dos seus produtos, eu também preciso te convencer a cada episódio de que vale a pena consumir o Normose. Então toda vez que eu escrevo um roteiro eu preciso me perguntar que história eu consigo contar de interessante pra chamar atenção pra algo que eu julgo importante. E pra isso, minha escrita é muito mais pensada como se eu estivesse numa conversa do que numa aula.


Eu escrevo cada módulo do roteiro como se eu estivesse, sei lá, respondendo um amigo no áudio do zap. Como se eu tivesse passado a tarde inteira lendo sobre alguma coisa e depois contando pra um amigo que não estuda o tema o porquê eu passei tardes e mais tardes lendo sobre um mesmo assunto. Mas aqui dentro do YouTube eu tenho essa competição intensa.


Ali do lado tem os vídeos relacionados, no seu bolso tem o celular, na outra aba tem uma outra rede social e aí rapidamente eu perco a sua atenção. Então eu fui aprendendo, escrevendo, a te lembrar de tempos em tempos que... Oi! Tô aqui! Tá aqui comigo ainda? Mudou de aba? Tá lendo os comentários? Volta aqui, ó! Tipo frase choquinho, pra chamar sua atenção, pra que a gente volte aqui, ó! Viu? Sabe? Ó lá, fiz de novo. Agora, como eu faço isso na escrita e tudo mais, aí tem o molho da casa, se você vai em qualquer restaurante, né? Então, quem sabe em outro momento a gente revele isso.


Mas acho que você já entendeu, não é? Mas o que eu posso te garantir que tem em todo roteiro do YouTube é o princípio da segurança. Você gosta de sentar sempre no mesmo lugar na sala de aula, sabe assim? Buscamos essa identificação. Então, quando você assiste Diva Depressão, Cauê Moura, Leon e Nilce comentando as coisas, nós estamos há uma década assistindo essas pessoas.


Nós nos sentimos amigos delas de alguma maneira. Aquela história de relação parassocial que já falamos aqui dentro. Essas pessoas são os nossos amigos que não nos conhecem.


E queremos vê-los fazendo a mesma coisa de novo, de novo, de novo e de novo. Todo mundo está buscando alguém pra se identificar. Até bordão vira uma coisa aqui dentro.


Uma identificação. Toda vez que você vê essas cores, essa thumb, essa identificação, essa introdução, essa identidade, o tal... E aí? Suave e tranquilo? Você se sente pertencente ao código que usamos aqui dentro do canal. E todo mundo faz isso.


E é isso que gera a nossa troca. E toda vez que eu faço um episódio diferente, como em alguns vídeos que eu me arrisco mais, tipo o episódio do Matrix, ou o episódio que eu volto pra 2008, eu sei que virão os comentários Ah, ficou confuso. Ah, preferiu o Normose de antes. Ah, tá muito denso.


É só eu sair da fórmula que eu sei que isso vai acontecer. E tá tudo certo também.


Formatos diferentes geram estranhamento, existe uma expectativa sobre os vídeos que eu vou fazer e nem sempre a gente vai conseguir cumprir. Às vezes eu preciso me dar ao luxo de não ceder à ditadura do algoritmo e experimentar algumas outras coisas. Mas todo canal acaba criando seu jeitinho de contar suas histórias e automatizar sua produção pra criar essa aproximação com o público. Por que você acha que os canais de react e live explodiram, por exemplo? As respostas são duas. Produtividade e identificação.


De um lado, não há nada mais genial pra ultraprodução dos algoritmos. Com apenas um produto de 3 ou 4 horas reagindo, você consegue produzir 3 ou 4 episódios pro seu canal sem muito trabalho. Os famosos cortes.


Depois, é essa identificação. Como você tá sempre com as pessoas produzindo sempre coisas parecidas, isso gera essa segurança de aproximação. E canais assim costumam explodir porque criam suas próprias comunidades.


Olha pro canal do Luide, por exemplo. Ele sabe usar muito bem esses conceitos de comunidade. São os mesmos samples que ele toca. As mesmas piadas.


Os mesmos bordões. E isso é incrível. Porque criou o tal Luigiverso.



Eu sou completamente birutuber, por exemplo. Que é quem assiste os cortes dele no YouTube. E também tem o chat tóxico.


Aqueles que participam das lives ao vivo. E entender isso faz muito parte da minha escrita. Criar comunidades e redes de afeto é o que há de mais poderoso aqui na internet.


Aqueles que emulam isso de maneira mecânica, com fórmula, só seguindo algoritmos, caem naqueles clichês mecânicos. Que são aqueles vídeos quatro coisas que não sei o quê, a quarta vai te surpreender, fiz não sei o que lá e olha só no que que deu. E assim por diante.


Mas mesmo nesse tipo de vídeo, tá lá, a fórmula história curiosa, ciência de identificação, comunicação efetiva e afetiva, mesmo no modo genérico. E como é simples de fazer, eles produzem absurdamente muito. E aí, não à toa são os maiores canais do Brasil.


Porque encapsularam o que era orgânico e ainda respondem a lógica de produtividade aqui dentro. Eu quis fugir dos últimos anos da repetição de conteúdo. O máximo que dá, pelo menos. Ou pelo menos enquanto dá. Por capricho? Talvez. Por ego? Bem capaz.


Talvez porque consumi o YouTube desde lá do começo e fui modulado a gostar de conteúdos assim. Sei lá. Mas nem por isso, é claro, eu deixo de ter minhas fórmulas e atalhos que eu fui criando e descobrindo ao longo dos anos.


Pra que eu não precisasse inventar a roda em todos os vídeos e começar do zero toda vez que eu fosse escrever. Quer um exemplo prático do que eu gosto muito de fazer? Eu sou viciado em metavídeos. Metalinguagem é a minha maior guia aqui dentro.


E isso acelera o meu jeito de contar uma história. Não entendeu? Eu explico. É assim. Eu tô tentando contar uma história sobre contar uma história enquanto eu aplico as técnicas que eu tô tentando passar pra você. Quer outro exemplo? Olha a thumbnail desse vídeo de fofoca. É feita no formato de fofoca.



Ou esses vídeos de marketing do absurdo que tão usando a linguagem do absurdo pra comunicar. Tipo no episódio sobre o Bertolt Brecht que eu tô falando sobre a importância que o autor dava pra dar os textos em fragmentos pra não encarar a atuação com muito realismo e de repente quebrar a quarta parede.


[publi]


Ufa, finalmente chegou a hora de escrever. Não. É hora de fazer nada.


E eu sou, particularmente, muito bom nisso. Procrastinação. Mentira, ócio criativo.


É nesse momento de pesquisa e produção do texto que já começa a parte visual do nosso vídeo. Como já falamos 1500 vezes aqui dentro, a estética é muito importante pra nós pra poder fazer política. A estética é o único jeito de fazer política.


Entendemos estética como disputa política, sobre pluralidades. Nós ganhamos na multiplicidade estética, nas múltiplas visões sobre estética que se juntam em comunhão e não em autofagia, não em única estética. Mas nós, aqui dentro do Normose, construímos a nossa, que demonstra os nossos valores, construídos junto de você, da nossa comunidade.


Então, em resumo, a nossa estética pode ser definida por um conceito. Cultura do remix. Cultura do remix.


Cultura do Remix


Um termo pra representar uma sociedade acostumada a compartilhar, transformar e editar obras previamente conhecidas e protegidas por direitos autorais, inseridas num contexto de criação do novo. A mistura, criando um terceiro elemento, como colagens, recortes, pedaços de vídeo, criando uma identidade que misture nostalgia, tecnologia, a partir de elementos visuais, como vídeos antigos, gifs, glits, 3Ds, que vão compondo essa identidade Normose.


Pra representar o passado, escolhemos em cada frase do vídeo texturas materiais, colagens, filmes analógicos ou digitais, e elementos visuais que compõem uma diversidade tecnológica ou audiovisual e que demonstrem o problema analisado através das imagens.


Até o da metalinguagem, lembra? E aí, se os vídeos estiverem em cenário, como é o caso de alguns episódios, tipo no vídeo que eu volto pra 2008, misturar o moderno e o contemporâneo, o sombrio e o claro, fazendo bruxaria, porque sempre temos pouco orçamento pra fazer essas coisas, e construir tudo que eu falei fisicamente. Aí temos mais uma etapa em ação, e pra grudar esses dois opostos, passado e presente, completamos a nossa identidade com a psicodelia das cores e das formas. Pra pensar e lidar com o contraditório, precisamos extrapolar as Normoses, as portas de percepção.


E aí a gente brinca visualmente com ilusões de ótica, cores surreais, abstratos líquidos, formas distorcidas, e acho que a melhor definição disso tudo junto continua a sendo a do Thiago Santinelli.


"Fala seus lixos! Caralho, o que eu gosto muito dos vídeos do Normose é porque, assim, são ótimos vídeos pra você assistir pra aprender. A didática dele é muito boa, a edição é boa pra caralho, mas são vídeos ótimos também pra você assistir muito chapado. Não tem nada melhor do que você ter um aprendizado enquanto você está se drogando."


Agora sim, chegou a hora de escrever. E eu nunca vou esquecer de uma lição poderosa de um professor da faculdade que citava Drummond.



Escrever é cortar palavras. É contraintuitivo, mas escrever bem não é escrever muito. Falar muito é fácil.


Difícil é escolher o que vai dizer. Isso sim é um exercício de desapego textual. Baixar a bola e saber seu lugar.


Aqui no YouTube eu não vou derrubar o capitalismo ou fazer a revolução em um só episódio. Eu não vou passar todo o conhecimento sobre um assunto numa série de vídeos. Até porque eu não tenho todo o conhecimento sobre nenhum assunto.


O que eu tenho são 12, 15, 28 minutos ou um pirula de duração que seja. Esse formato tem suas limitações. Nunca vai superar um livro, uma leitura, um estudo contínuo ou uma troca presencial em movimentos.


Eu estou aqui só para plantar sementes. Eu estou aqui só para estimular a leitura. Então o que eu costumo fazer aqui dentro é escolher um recorte de um assunto e aplicar um conceito.


Mais do que isso, seria a hora de escrever livros. E talvez chegue esse momento pra mim em alguma hora. Mas não agora. Agora eu faço vídeos dentro de uma plataforma de entretenimento e propaganda. Então o que eu posso gerar dentro desses vídeos? Motivação de pesquisa, disparar alguma vontade para a luta, disparar gatilhos de organização e só. Estamos aqui dentro, dentro de uma plataforma de emoções.


E o que eu posso gerar com os meus vídeos são emoções. E isso é uma pergunta importante para qualquer vídeo que eu escrevo. O que eu quero gerar em quem vai assistir? Qual emoção o vídeo pode provocar de positivo para o debate? Sobretudo depois que eu estudei tanto a importância dos afetos políticos na comunicação, essa passou a ser a base principal dos meus textos.


Provocar uma reflexão teórica a partir da emoção e da emoção audiovisual. E a linha dos meus vídeos é sempre lembrar que aqui é o canal Normose e a gente está buscando as normalizações doentias, aquilo que é normalizado mas não é.


Essa é a minha busca para ver se um texto já está na hora de ser lançado. Obviamente, eu não consigo fazer isso em todos os episódios aqui dentro, mas é o que eu estou sempre perseguindo fazer. Então, beleza. Agora que já temos o episódio todo escrito, é hora de mandar para a edição.


Edição


"Ó, Gelo, corta essa parte toda aí que ficou tudo cagado, tá? É? Entendeu? Metalinguagem."


É para esses erros que vem a hora da magia, a edição do vídeo.


15 a 20 dias de doses intensas, de uso de tóxicos intensos e muita música eletrônica? Não exatamente. Há algum tempo, a equipe antiga e o nosso querido Gelo dividem a edição dos vídeos e aplicam todos esses conceitos juntando o meu texto às escolhas visuais de Tila e Jéssica que quem sabe em algum momento eu posso fazer uma live com todos eles só para falar de edição. Sei lá, coloca aí nos comentários.


Criam trilhas sonoras, colocam marcas de edição, timing do vídeo e geram essa emoção procurada. Sem a edição, sem trilha, sem nada, isso aqui é um grande audião no zap, completamente entediante e sem graça. Então, essa foi a maneira mais sincera que eu encontrei de mostrar como é o meu processo de pesquisa e de escrita e passar aquilo que eu estou sentindo no texto.


Por favor, isso aqui não é uma fórmula, tá? Eu aposto que cada um que produz conteúdo criou a sua fórmula e as suas etapas de criação de conteúdo e fazer uma coisa ou outra não garante que o seu canal vai fazer sucesso nem nada do tipo. Acreditar nisso é uma visão muito meritocrática, empreendedora da coisa. Muito do que eu fiz pode estar certo e muito do que eu fiz pode estar errado e há grande chance de nada disso dar certo porque ainda tem o fator sorte.


A maioria dos canais também teve esse fator sorte pra dar certo. Inclusive aqui dentro do Normose. Bom, mas no geral essas são as etapas.


Exceto quando não. E aí esquece tudo isso que eu falei pra cima. Esquece tudo.


Em vídeos urgente, como o do PL da Fake News, tudo muda. Aí eu preciso questionar menos a minha escrita, aí não tem tempo de descanso, massa do bolo, nem nada dessa besteirada. Aí é loucuragem porque tem data pra acabar e a data de entrega é ontem.


E aí é lógico, pra funcionar na lógica do algoritmo e tentar influenciar na opinião pública as coisas tem tempo e eu não tenho uma estrutura como o Google teve pra usar a sua máquina de propaganda. Aí vai na estrutura bloco do eu sozinho. A Euquipe.


Não dá pra contar com as outras pessoas pra varar de madrugada comigo. É óbvio. Então, passo eu a madrugada sozinho, lendo, produzindo, gravando, editando, tudo sem parar o máximo que dá.


Aí nesses casos o texto até que sai direitinho porque é o primeiro a ser feito. Mas é lógico que aí nesse caso a edição tem vários bugs. Por exemplo, nesse vídeo aí do PL das Fake News teve muita gente achou que tava tendo algum tipo de censura e tudo mais porque tinha corte nos vídeos.


Não, a censura era do meu cérebro. Bug. Cansaço.


Não aguentar mais trabalhar varado. É mais isso mesmo. Agora, eu não tô contando isso com nenhum orgulho, nenhuma romantização nem nada do tipo.


Plataforma Youtube


É o preço do sucateamento dessa plataforma e isso não é nada bom. Essa ideia de trabalhar sem nenhuma garantia do amanhã pra um chefe algoritmo que te bloqueia e faz coisas sem nenhuma transparência não tem nada de glorioso. Apesar de ser meu sonho comunicar no audiovisual, eu não vou romantizar essa parada que a gente vive hoje.


O YouTube é uma vitrine disputadíssima e o campo aqui é selvagem. Se ilude quem acha que é possível fazer milhões com as redes se você não estiver no topo da pirâmide. É como no futebol. Você olha pro Neymar fazendo milhões e acha que qualquer jogador de série C já é rico. Eu sou um série C quase D. Sou um profissional sustentado pelo meu time de apoiadores. Tô vivo, crescendo na carreira mas um mero jogador de série C que precisa fazer bico pra ir fora pra complementar a renda.


O Felipe Neto faz milhões aqui dentro e posta 30 vídeos por dia com milhões de visualizações e ainda tem outros negócios. O Casimiro tem dois canais. Agora lança a Cazé TV e tem cortes que saem as milhões em todos os lugares. Ali é a elite.


Nós já crescemos muito desde o futebol naval em 2018 e tô vivendo disso sim mas tem que estar sempre no corre. Por isso quem produz pouco e optou pela profundidade ao invés da quantidade só tem um caminho manter uma constância pra juntar uma comunidade de pessoas que acreditam no seu trabalho e se tornem assinantes.


Pix, a loja, fazer pequenas publis o Catarse que é o nosso financiamento coletivo e que nos dá alguma margem de segurança mas fora do topo dos influencers não tem luxo nenhum não.



Talvez muitos youtubers escondam essa parte pra parecer muito mais legal do que é. E veja eu não tô reclamando não tá, jamais!


Eu só tô contando as etapas de um caminho de um projeto um sonho que virou realidade mas sem romantização. É um trabalho como outro qualquer que é sucateado numa plataforma privada que não tem vínculos empregatícios comigo, direitos, transparência de comportamento que eu não sei como funcionam os algoritmos. Uma hora ou outra a gente conversa da importância da sindicalização e da organização dos criadores que já rola na Alemanha e uma hora ou outra vai acabar vindo pra cá.


Mas eu não tô reclamando. Acima de tudo porque não há lugar no mundo que comporte o caos e o medo das minhas escolhas.


Quando pequeno eu quis aprender música e voz, porque sonhava em ser dublador. Depois escolhi teatro, aí decidi que não dava pra fazer só isso meu negócio era fazer faculdade. Pensei em jornalismo, psicologia e fui parar na história. Sou historiador mas trabalhei com os mais diversos bicos do meio do caminho e nenhum desses interesses e bicos ficou pra trás.


Eu gosto de fazer todas essas coisas. Qual é o lugar do mundo que abarcaria ao mesmo tempo tudo o que eu fiz na vida de aleatório numa profissão que me permite inclusive domesticar meus hiperfocos e ansiedades em mil assuntos.


Por isso veja, eu poderia aqui partir por uma história meritocrática individualista, dizer que depende muito do meu canal de como eu evoluí, como nós éramos pequenos e vencemos sozinhos e tal tal tal... mas é mentira. Apesar de ser um trabalho bastante solitário de sentar, pesquisar, escrever, o Normose só deu certo pela força da coletividade, é tudo coletivo.


Comunidade Normose


Quando algumas poucas pessoas chegaram nesse canal quando ele era nada, pouquíssimos inscritos e acreditaram divulgaram até que alguém maior conheceu e acabou alavancando meu trabalho aqui dentro.


Quando um pessoal acreditou, ainda no início do Normose, que era possível contratar uma pessoa pra fazer um documentário sobre a Lava Jato. O pessoal dos petroleiros mudou a minha carreira dali em diante, quando uma comunidade passou a me apoiar financeiramente com o meu catarse e passou a mudar a minha vida pra viver só da produção de vídeos. Mas nada disso foi sozinho, entende?


Foi em coletividade. Essa história de faz sua carreira sozinho meritocracia é besteira ideológica. É preciso fugir dessa desumanização humanizada que coloca o criador de conteúdo num pedestal ou numa máquina de produção. Como se ele fosse intocável. Um ser que não erra ou que não evolui e não aprende que é tratado como um personagem estático do outro lado da tela.


E eu sei que agora com o rosto havia chances do culto à personalidade, que tentamos fugir ao máximo. Não dá pra esquecer desse problema, o vídeo aceita qualquer coisa e passa a impressão de verdade. Se eu falar com convicção que a terra é plana ou se eu mostrar os dados que a terra não é plana o vídeo grava do mesmo jeito.


Eu faço vídeo ensaio. Eu não tenho a verdade absoluta. Não é pra ser repetido como um papagaio. Eu tô colocando as minhas ideias à prova mas não como teoria verdade. Cheque nossas referências e fontes, cheque nossas leituras.


Então obretudo tenha pé atrás com quem demoniza autores, crucifica leituras diversas e não estimula sua pesquisa. O vídeo aceita qualquer coisa. O vídeo aceita inclusive gurus em qualquer área do conhecimento. Mesma área do conhecimento que concorda com você.


Metalinguagem e Metavídeo


É assim que é feito um vídeo do Normose. Ao longo desse episódio eu acabei fazendo mais um metavídeo e dessa vez mais do que nunca esse foi um vídeo um episódio sobre um vídeo, um episódio sobre um episódio. Falar da estética da estética. e se você está pensando que tudo isso aqui na verdade é um pedido sincero de ajuda para continuar esse canal, porque está foda lidar com todas as contas apesar do nosso crescimento. Então sim você está certo é isso mesmo.



Abrir a minha estrutura aqui e jogar as claras é a melhor maneira de manter a minha comunidade. Quem permite o trabalho existir de verdade não é o youtube, que não paga quase nada. Não são as publis que vendem de vez em nunca, sobretudo em um canal como o nosso que tem os temas como o nosso.


Quem mantém isso aqui existindo é o catarse, o financiamento coletivo que não muda as regras de uma hora para a outra, que não retira os meus custos sem explicação, que não depende de não entrar em polêmica para permitir que as marcas entrem aqui dentro.


Então por isso que eu estou abrindo o jogo. Ainda mais agora que meu corpo está pedindo um descanso, que eu preciso das primeiras férias de verdade, que o canal nunca conseguiu ter.


Eu já até ensaiei isso algumas outras vezes mas no governo Bolsonaro não dava. E a melhor maneira de fazer isso sem parar os vídeos é com apoio da comunidade. É com isso que eu consigo dobrar o número de vídeos e hoje é o que? final de outubro e eu já estou gravando esse vídeo.


Então fique tranquilo que a gente vai ter vídeo até março sem parar, mesmo comigo estando de férias. Mas porque aqui dentro trabalhamos o dobro para poder descansar. Então se você quer que esse trabalho continue em 2024, manter esses custos está foda. O canal tem crescido muito e a nossa comunidade é invejável mas hoje somos apenas literalmente 0,001 de apoiadores se olhar todos os nossos seguidores dos canais


Imagina se a gente chegasse em 0,5%. Imagina a força comunitária de vários criadores se isso acontecesse. É assim que sobrevive o Brasil Paralelo. Se você não quiser e não puder fazer nada disso, nem compartilhar e dar like, pelo menos uma coisa você pode. Se você gosta do meu trabalho e me encontrar por aí nos eventos nas palestras, nos roles ou sei lá onde chega para dar um salve, trocar uma ideia, contar sua história... eu gosto muito de imaginar quem são as pessoas que estão do outro lado assistind. Isso aqui, pelo menos isso, é de graça e eu tenho certeza que você pode fazer. Combinado assim?


Então vamos conversar nos comentários


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Este texto é uma transcrição automatizada do material original apresentado no vídeo abaixo. Pode conter erros de transcrição. Recomendamos assistir ao vídeo para uma compreensão mais precisa e completa.


Normose - como ROUBAR sua ATENÇÃO? - Estética do Caos


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