E se o álcool for proibido? - Abuso, vício e Lei seca!
- Antologia Crítica
- 15 de ago. de 2024
- 15 min de leitura
Atualizado: 23 de ago. de 2024
Não é novidade de que a história da humanidade está recheada de decisões completamente sem sentido e inúteis, mas, dentre os milhares de erros sinistros do século XX, o único que conseguiu revogar uma emenda da Constituição dos Estados Unidos, com o apoio de pastores, empresários, cristãos, padres, feministas, nacionalistas, esquerda e direita, foi a Lei Seca Americana, a proibição do álcool nos Estados Unidos.
Um projeto muito burro, que fundou a máfia americana, deu poder a Al Capone, mas que tem muito a nos ensinar, sobre combate às drogas e sobre o que não fazer nesses casos. Opa, suave tranquilidade, hoje nós vamos desvendar os mistérios da Lei Seca dos Estados Unidos.
Precisamos entender como esse país conseguiu incríveis 500% de presos a mais de 10 anos, como surgiu o uso do álcool de cozinha para beber, de que forma Al Capone ganhou tanto poder, que tipo de contexto de sociedade aceitou e aplaudiu aquela lei e o que ela pode nos ensinar sobre proibicionismo, abuso de álcool e milícias brasileiras.
Pois é, o tema vai bem longe, então fica suave, vamos até o fim do vídeo que tem história pela frente, deixe seu like, sua inscrição, seu sininho e apoia nosso canal com pix se você gostar desse episódio. E vamos lá.
O ato Volstead, Lei da Proibição ou conhecidamente Lei Seca Americana, durou 13 anos, 5 meses e 9 dias a partir de janeiro de 1920. Quando passou a ser proibida a fabricação, o transporte e a venda de qualquer bebida alcoólica. Porém, comprar e consumir nunca foi proibido.
Isso em si já é um fato muito curioso, nunca se proibiu o uso do álcool. Aliás, na história ocidental, não há registro de proibição de bebidas alcoólicas nessa magnitude. Ao contrário, o uso cerimonial e sagrado do álcool sempre foi recorrente na história das sociedades.
Billy Sunday, Metodistas e Puritanos
O cristianismo, por exemplo, nunca proibiu o álcool e, inclusive, tem como primeiro milagre de Cristo multiplicar o vinho. O vinho sempre foi tomado com o sinal de boa colheita, e aqui vão algumas passagens da bíblia para você jogar no Google e conferir com os próprios olhos como Deus gostava de vinho.
Gn 27:37
Nm 18:12
Dt 12:17
Jz 9:13
Pv 3:10
Os 4:11
Não à toa, a consagração maior da missa utiliza o álcool como sangue de Cristo.
E pelo que eu me lembro, Jesus transformou a água em vinho e não em suco verde, ou whey protein. Mesmo Calvino e Lutero, em suas reformas protestantes, admitiam a legitimidade do bebê para ficar alegre. Há registros, inclusive, de que Lutero gostava de fazer a sua própria cerveja artesanal gourmet.
O cristianismo sempre pregou a temperança, o equilíbrio, mas a ironia é que a proibição foi conquistada principalmente pelas igrejas evangélicas protestantes e especialmente as metodistas batistas, as mulheres cristãs pela temperança e o partido proibicionista.
Mas veja, não foi do nada que grupos tão diversos se juntaram pela lei da proibição. Foi a emergência do mercantilismo e das revoluções industriais que as substâncias sagradas tornaram o que são hoje, mercadorias, commodities que valem mais que ouro, que serviram para financiar, explorar, fazer comércio e criar muito poder de controle político.
Toda substância entorpecente gera muito dinheiro como mercadoria. E onde há poder, dinheiro e falta de leis, cresce a violência. A violência, fruto da desigualdade da pobreza de Chicago, abriram um espaço para uma coisa perigosa.
Um certo discurso salvacionista começou a rodar no ar. Soluções simplistas, que ao invés de olhar para as causas sociais da pobreza, que aumentavam violência, decidiram buscar culpados pelo caos, buscar inimigos, como o ser humano adora fazer. E aí surgiu ele. O álcool.
Como o responsável direto pelo caos que acontecia no país. E foi assim que muitos grupos com propostas diferentes, mas um mesmo propósito, se juntaram para destruir o comércio de bebidas.
Vamos conhecer esses grupos? Primeiro foram os religiosos, como já citamos. Pastores que odiavam álcool, mas adoravam dinheiro, cresciam aos montes pelos Estados Unidos e prometiam salvação para quando a proibição acontecesse. O pastor Billy Sunday era um dos mais furiosos e famosos, e gritava por todos os cantos sobre a mudança que o mundo teria com o fim do álcool.
"O reino das lágrimas terminará. Os curtiços em breve serão uma memória. Transformaremos nossas prisões em fábricas. Os homens e as mulheres serão corretos. E o inferno irá finalmente desaparecer." Sabe de nada.
Esses protestantes seguiam a linha de John Wesley, um dos fundadores dos metodistas, que tinham um método para a salvação, que passava por uma nova visão completamente diferente da tradição cristã. Sobretudo, todas as recomendações de temperança, ou seja, de moderação, que a Bíblia continha, na verdade deveriam ser reinterpretadas. O álcool passa a ser ruim em si.
O álcool é o diabo em garrafa, nessa visão. Wesley propunha uma nova leitura. Quando a Bíblia elogia o vinho, é para ser entendido como o suco de uva.
E quando fala mal, é álcool fermentado. É a versão conversionista. A conversão em Cristo e a salvação só se dão por meio da abstinência que te deixaria puritano.
Essa campanha de pastores encampados por Billy Sunday vinham ao encontro das exigências de sobredade durante a Primeira Guerra Mundial, pregada pelo governo dos Estados Unidos, e trouxe muitos fiéis e muita grana para o próximo dos pastores.
Até porque esse discurso também crescia em outro setor, o movimento sufragista. Sim, o movimento social que lutava por direitos e o voto feminino também embarcou na proibição do álcool.
2. Sufragistas, Alcoolismo e WCTU
E o argumento tinha, inclusive, um certo sentido até que verdadeiro. Numa sociedade que valorizava a submissão geral, tanto das mulheres aos homens, como de todos diante de Deus, tinha como único espaço de crítica a pouca fé dos homens. O homem bêbado não trabalha, gasta o salário, vira violento na rua, no bar, em casa, comete violência contra essas mulheres, sobretudo, os afasta da igreja, ou seja, da família e de Deus.
Os grandes pilares dessa gente de bem, conservadores. E nesse sentido, o movimento do sufragio feminino se juntou ao discurso religioso, mulheres cristãs, pela temperância, piquetes de oração em frente aos bares, manifestações contra o álcool e até a destruição de barris de bebida machadadas por uma das líderes do movimento, a sufragista Carrie A Nation, que tem um nome curioso, significa carregando uma nação. Enfim, nessa época, cerca de mil saloons ou bares, especialmente na região do Ohio, foram atacadas e destruídas por Carrie.
Agora, talvez você esteja se perguntando, como é que o movimento crescia e quem financiava tudo isso? Então, vamos falar deles, o empresariado que também estava na campanha.
3. Empresariado, Racismo e Xenofobia, Magnatas Industriais e Partido da Proibição.
Número 3, Anti Saloon League, o empresariado. Sem a elite financeira, o projeto não ia sair, e foi com os grandes empresários do período que a organização fundou a Liga Antibar, para se encontrar e disseminar um discurso xenófobo, religioso e racista, para fazer lobby pela imposição da proibição dual.
Os empresários do Nordeste dos Estados Unidos, mais industrializados, tinham um sentimento anti-migrante, que associava o consumo de cerveja aos latinos e tentava expulsá-los. No sul do país, após a Guerra Civil, a motivação era racial, uma tentativa de restringir o tipo de atividades de lazer que os negros recém-libertados tinham acesso. Nomes muito famosos, como dos bilionários J.D. Rockefeller e Henry Ford, foram os primeiros investidores pela proibição, por qual motivo? Produtividade.
A crença de que a proibição do álcool aumentaria as horas de trabalho e a qualidade da vida do trabalhador. Ford era um aficionado pelo controle de seus funcionários, e tentava mandar em todos os seus hábitos. Patrão bilionário é muito descolado na realidade, né? Mas aí, todo esse movimento, juntou e deu num partido, o Partido da Proibição.
Pois é, esse partido foi o principal grupo de lobby para a criação da Lei Volstead, e existe até hoje. Pasme, o Partido da Proibição concorreu à presidência dos Estados Unidos em 2008. Estados Unidos, que exemplo de democracia, não é? Não.
Enfim, de qualquer modo, o que o movimento precisava era de um partido trazendo força política e econômica para jogar. O partido passou a dizer que cereais, maltes, açúcar e alimentos básicos para a produção de álcool estavam sendo usados em período de guerra para a produção de cerveja, ainda mais porque grande parte das fábricas eram alemãs, então, beber cerveja seria antipatriótico. Ou seja, havia um contexto político para encampar esse projeto, e fazer tantas pessoas acreditarem numa coisa completamente sem lógica, e foi desse modo, nesse contexto de país que passou a figurar a Lei Seca.
Toda bebida com mais de 0,5% de álcool era intoxicante. Pra você ter noção, cervejas fracas tem 2% de álcool. E foi assim que o projeto foi aprovado.
E aí, é claro que o resultado não poderia ser outro, fracasso total. Do dia pra noite, os negócios de bebidas, sejam de produção, armazenagem e transporte, foram colocadas na ilegalidade, e grande parcela dessa camada de negócios foi preenchida por pequenos e médios empreendimentos. Pessoas comuns, como eu e você, que passaram a instalar alambiques e adegas nos porões de casa para produzir o próprio álcool e aumentar a renda familiar.
Empresas de fachada para transporte de pequenas quantidades também se espalharam. As bebidas eram colocadas desde carrinhos de bebê até caminhões com bebidas escondidas pelas cidades americanas. Mas é claro que o povo não ia parar de beber.
E no dia seguinte da proibição, bares clandestinos começaram a ser abertos em todo o país. Chamados com o trocadilho de speakeasies ou 'fala mansa', os bares eram disfarçados de clubes de reunião e eram fechados apenas para cadastrados. E se você acha que isso era uma atividade de elite, apenas para um e outro, você se enganou.
Em apenas um ano, só na cidade de Chicago, foram 32 mil bares speakeasies abertos. 32 mil negócios ilegais! Já pensou nisso? E não havia nenhum controle de preço ou de qualidade. Uma bebida cara por litro, como, sei lá, um uísque, conseguia ser vendida até que com lucro, porque se transportava pouco. Ali no Mocó, ninguém percebia, beleza.
Mas já bebidas baratas, de alto consumo, como a cerveja, precisavam de todo um esquema para ser lucrativo. O transporte queria muitas carroças ou muitos caminhões.
Isso daria a bandeira demais tanto para a polícia quanto para gangues rivais que poderiam roubar o álcool. Qual a solução? Contratar policiais, fiscais e membros de outras gangues para fazer o transporte para você. Mas é claro que isso encarecia as encomendas.
E aí veio o problema. Não tinha cerveja sempre, só às vezes. E o que as pessoas faziam? Quando a cerveja chegava nos bares, era hora de encher o caneco.
Afinal de contas, você não sabia quando seria a próxima bebedeira. E o que aconteceu? Explodiu o uso abusivo e os casos de internação por álcool pelos Estados Unidos. E não foi só álcool de bar, não.
Álcool caseiro. Muitas pessoas passaram a beber aquele álcool de cozinha. Aquele de 95%. Nessas, é contabilizado de 50 a 100 mil mortes pelo consumo de metanol, além de mutilados e cegos, por causa da proibição. As pessoas não param de beber. Elas encontram brechas.
E quer ouvir algo quase engraçado? A produção de uvas secas na Califórnia explodiu. Um novo produto entrou na praça. O tijolo de uva seca.
Por quê? Porque as pessoas compravam para o consumo de vinho. É quase como se o produto dissesse, cuidado, se você deixar essas uvas fermentadas numa garrafa fechada, pode virar vinho. Ah, também houve isenção da lei para cultos religiosos.
O vinho podia ser usado, por exemplo, nas missas. E, de repente, por coincidência, nessa época, muita gente se encontrou com Deus e abriu suas igrejas. Líderes de gangues passaram a surgir e ser protegidos pela população.
Afinal de contas, eles que empregavam metade do bairro onde as produções aconteciam. O fundo de quintal passou a produzir cerveja sem verificação aos montes.
Quando uma substância é permitida, automaticamente leis de padrões de qualidade surgem, e com eles um código de conduta sobre o horário de funcionamento dos bares, locais que se podia beber ou não, etc. E tudo isso foi jogado no lixo.
Já que eu vou infringir a lei mesmo, por que eu não posso beber na rua? Por que eu não posso beber em todas as horas? Por que eu não posso beber álcool de cozinha? Por que não fabricar uma bebida que pode ser tóxica? Já que fabricar uma bebida de qualidade é mais caro e é crime do mesmo jeito. E se você acha que isso é exagero ou que as pessoas eram burras, você provavelmente já esqueceu a quantidade de estupidez que vivemos na pandemia. As pessoas tomaram sabão.
Enfiaram ozônio no cu. De qualquer modo, a proibição que prometia diminuir e acabar com a violência, aumentou a violência. Não só pelo abuso do álcool em si, mas pela oportunidade de negócio que se criou em torno desse álcool.
Imagine, por exemplo, que o governo decida proibir, sei lá, o repolho. O mercado ilegal passaria a plantar repolho e vender nas vielas a preços absurdos. Bastante difícil, porque a demanda do repolho é elástica.
Se ficar muito caro, as pessoas podem comprar, sei lá, a acelga, couve, brócolis e substituir o alimento com drogas, a regra é o contrário. A demanda é inelástica. Se você proibir, as pessoas vão continuar comprando.
Se você subir o preço, as pessoas vão continuar comprando. E aí é matemático. O que é proibido é de difícil compra.
O que é de difícil compra tem mercado selvagem e desregulado. E isso explode o preço e poder de lucro em cima da substância. A única lei é eliminar a concorrência com violência.
A extorsão, a corrupção e as mortes passam a ser rentáveis, porque todo o custo é embutido no custo da droga. Era questão de tempo para aqueles bandidos que falamos no começo do vídeo se profissionalizassem e criassem o seu monopólio no mundo do álcool. As mafias e o crime organizado com a estrutura que conhecemos hoje nasceram aí.
E é assim que chegamos a ele, Al Capone, o mais malandro e poderoso dos mafiosos da lei seca. Então antes de entrar nessa parte, eu aprendi que se eu pedir no meio do vídeo like, sininho, inscrição e te lembrar que esse trabalho tem custo e que o seu financiamento coletivo mantém tudo isso existindo, parece que menos gente esquece. É verdade? Não sei. Vamos testar.
Alphonse Gabriel Al Capone, A.K.A Al Capone.
Al Capone começou cedo no crime. Seu temperamento explosivo na escola gerou expulsão por agredir uma professora aos 14 anos, o que levou Alphonse para a rua, vivendo muito cedo de bicos, trambiques e pequenos furtos. Foi ali que encontrou sua primeira gangue, aos 15 anos.
E foi ali que ele conheceu Johnny Torrio, seu grande mentor no crime desde cedo, que junto de Big Jim Colosismo, outro gangster de Chicago, mandavam em mais de 200 bordéis e 300 lojas da região. Porém, quando veio a lei seca, Johnny viu uma oportunidade de negócio e tentou fazer com que a gangue toda entrasse para o mercado. Big Jim não topou entrar para o mundo do álcool e a gangue rachou.
A cidade era muito pequena para os dois e começou o bang bang. Um mês depois, Big Jim foi cravejado de balas e o suspeito maior foi Al Capone, que ganhou muita credibilidade com Torrio, que passou a ser líder sozinho da gangue que agora ganhava um nome. Eram os Chicagos Outfit.
A Chicago Outfit chegou a ter 300 a 400 membros e era conhecida pela violência bruta. Em 24, Torrio e Capone sofreram uma série de atentados contra suas vidas e temiam a morte. No fim de 25, Johnny viajou para a Itália e nunca mais voltou.
Com uma fortuna estimada em 50 milhões de dólares, o que dá uns 500 milhões para os dias de hoje, Johnny decidiu viver a sorte grande de não ter sido morto e foi curtir sua aposentadoria na Itália, fazendo com que a gangue sobrasse no colo de Al Capone. Com 26 anos de idade, a Alphonse agora era a chefe da maior organização dos Estados Unidos. E dali em diante, quase não houve mais disputa de tráfico.
Al Capone conseguiu um monopólio total via violência e suborno. Por volta de 500, gangsters conhecidos foram mortos pelo bando de Capone entre 25 e 29. Ele virava sócio de todas as lojas e ganhava uma taxa de todos da região.
Eu não tô falando de sócio figurativo não, é sócio sócio mesmo. Al Capone buscou criar sua personalidade pública. Colocava-se sob holofotes, fazia distribuição de alimentos, beijava e apertava a mão das pessoas do bairro.
Se parecia um político. E sempre repetia que a proibição do álcool não trouxe nada, senão problemas e mais poder. E quem declara isso jamais poderia ser o chefe da máfia do álcool, não é? E foi assim que Capone matou muitas pessoas, pessoalmente ou como mandante, sem ser responsabilizado por nenhuma morte.
Primeiro porque quase todos os mortos eram bandidos rivais, e ninguém ia fazer BO na polícia pra reclamar a morte de um bandido. E o estado também fazia vista grossa, porque Capone acabava fazendo serviço sujo que o estado não fazia. Depois, cidadãos que apareciam pra testemunhar contra Capone desapareciam, e dava medo em todo mundo.
Capone sempre tinha um bom álibi. Como ele lavava seu dinheiro ilegal nas lojas que era sócio, ninguém conseguia encontrar problemas jurídicos com ele. E quando encontravam, ele subornava o juiz e a polícia, quem quer que fosse.
E se não subornava, mandava matar. Os dados apontam mais de 900 milhões em suborno e faturamento de 100 milhões de dólares só para Capone a cada ano por causa da Lei Seca. Foi só em 1931 que ele foi pego, depois do fim da proibição, e não foi pego pelos crimes de máfia não.
Al Capone rodou por sonegação de imposto, numa brecha que encontraram pra prendê-lo. E o bicho ficou só 5 anos na cadeia até 1939, quando ganhou a liberdade por conta da saúde dele que piorava por causa da sífilis e dos distúrbios mentais que ele apresentava. De qualquer modo, os próprios proibicionistas como Henry Ford e Rockefeller começaram a rever suas posturas.
Depois da crise de 1929, há uma mudança completa na opinião pública. O álcool, que era um produto de alta lucratividade, foi parar na mão do mercado paralelo. E olha a ironia.
Rockefeller escreve uma carta ao reitor da Universidade de Colômbia, que dizia que nem ele, nem o pai, nem o avô colocaram uma gota de álcool na boca, mas ele nunca esteve tão arrependido quanto a Lei Seca, que desmoralizou todo o sistema legal americano, porque ninguém mais respeitava a lei. A corrupção moral se espalhou na sociedade. Revogar a Lei Seca passou a ser uma questão de respeito moral à Constituição, ou uma questão de lucro pra ele também. Aí fica com você pra decidir.
De qualquer modo, em vez de acabar com vício, pobreza e corrupção como desejavam, a Lei Seca que vigorou no país levou ao aumento de todos esses índices, e muitos movimentos sociais agora se organizavam pra acabar com a Lei Seca. As ruas imploravam por cerveja legalizada.
A partir de 1932, com a eleição de Roosevelt e o New Deal pra resgatar o país, isso porque o país precisava de grana, e foi via álcool que isso foi resolvido. Ai, os Estados Unidos, que democracia linda, não? Não. Com o tempo, as substâncias foram sendo controladas e regulamentadas, e o uso do álcool foi diminuindo como um problema normal pra sociedade americana.
Problema esse que se arrasta até os dias de hoje. De qualquer modo, começou outra guerra. Dessa vez não contra o álcool, mas contra substâncias que eram ligadas a grupos étnicos minoritários.
Como assim? A maconha era ligada aos mexicanos, o ópio aos chineses e a cocaína aos negros. A nova guerra às drogas passou a ser uma guerra contra pessoas. E talvez é a guerra mais duradoura, mais cara e com mais vitórias das drogas que tivemos até hoje.
A guerra nunca é contra uma substância. A guerra é sempre política, moral e pessoal. Contra um grupo de pessoas específicas, porque é muito lucrativa.
A experiência dos Estados Unidos nos ensina muito sobre a proibição. Não há como o Estado vencer uma guerra às drogas. Mesmo num ato forte como a Lei Seca, o resultado é a criação do tráfico.
Sobretudo quando o Estado não resolve o problema social, dando espaço para essas máfias cobrarem suas taxas, prometendo segurança contra eles mesmos, como fazem as milícias do Rio de Janeiro. Proibir é sempre o pior caminho. Substâncias entorpecentes não vão parar de ser usadas.
Escolher a proibição, ou a regulação, ou a temperança é escolha nossa. Agora fica aí pra pensar. A Ambev, hoje, é a principal empresa do Brasil. Ela é duas vezes maior que a Petrobras. E vende o que? Drogas. Legais.
O álcool. A solução então é proibir o álcool? E fechar a Ambev? Acho que não. Temos que encarar a realidade. 10% das pessoas terão problemas com o álcool. 90% não terão. O lucro cobre o déficit.
E na verdade, o álcool pode ser vetor de integração social, vetor de cerimônia, e vira uso abusivo justamente pela maneira que lidamos com ele. Que mesmo na legalização, é romantizado. Por isso, esse episódio não tem nenhum tipo de apologia, ou de apoio, ou incentivo ao álcool.
Eu, por exemplo, não bebo há literalmente 10 anos. Eu não gosto. Não me faz bem. E sinceramente, eu não consigo compreender porque as pessoas gostam tanto. Mas isso sou eu. É o que eu faço da minha vida.
Outra coisa, no entanto, é romantizar o álcool, que corrobora com o uso abusivo, ou querer proibí-lo na mão das pessoas. Nem proibição, nem superexposição, romantização, vangloriação. Nós precisamos tratar o álcool como ele é. E que sim, muitas vezes, ele gera uso abusivo.
Ele dá muito poder para empresas trilhadárias como a Ambev, que controlam a política do nosso país. Agora que entendemos que a proibição não é a solução, vamos conversar de uso abusivo do álcool. E como o uso abusivo não é um fator individual, mas social.
Como o uso abusivo fere a todos ao nosso redor, e é um problema coletivo. Agora sim, estamos prontos para um debate sem moralismo sobre álcool, abusos e outras drogas. Mas, esse episódio já ficou gigantesco, e eu acho que isso é um assunto para um episódio a parte.
A mensagem desse aqui já foi passada, né? Faz se necessário um episódio 2, que sairá. Quando? Não sei. Você que acompanha o canal sabe que a produção aqui é trabalhosa, mas sai.
Demora, mas sai.
Enquanto isso, você pode assistir os outros vídeos sobre drogas e legalização que fizemos aqui no canal, e se puder, contribuir divulgando esse vídeo por aí, ou com assinatura no financiamento coletivo, ou o Pix, que mantém a nossa equipe de roteiro e edição rodando na força total, e quem sabe, possa fazer o vídeo sair o mais rápido possível. Para terminar então, eu quero agradecer aos nossos antigos assinantes que nos trouxeram até aqui, e a cada um deles, as pessoas do grupo do nosso Telegram, muito obrigado por possibilitar o Normose de chegar até aqui.
E a você que quiser chegar e aparecer aqui nos agradecimentos, como pareça. Fica suave, fica tranquilo. Acho que todo mundo já fechou o vídeo, quando a gente chega nessa parte de divulgar as coisas.
Provavelmente não tem mais ninguém me ouvindo. Se tem, comenta aqui embaixo. Cuide-se, busque a temperança.
É nóis. E falou.
_
Este texto é uma transcrição automatizada do material original apresentado no vídeo abaixo. Pode conter erros de transcrição. Recomendamos assistir ao vídeo para uma compreensão mais precisa e completa.